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O que síndicos e condôminos precisam saber sobre o rateio de despesas por fração ideal

A interpretação apressada de decisões judiciais costuma gerar ruído, desgaste em assembleias e, muitas vezes, processos que já nascem com baixíssima probabilidade de êxito.
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Nos últimos dias, alguns síndicos e proprietários de coberturas nos procuraram para compartilhar uma notícia divulgada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, segundo a qual a Justiça teria considerado ilegal a cobrança de taxa condominial diferenciada para unidades de cobertura.


A repercussão gerou apreensão ou expectativa em vários condomínios, especialmente entre aqueles que adotam o critério de rateio pela fração ideal - que, vale lembrar, é o padrão legal previsto no art. 1.336, I, do Código Civil e no art. 12, §1º, da Lei 4.591/64.


Como escritório especializado em Direito Condominial, avaliamos tecnicamente a decisão divulgada e verificamos que a matéria atribuía ao Superior Tribunal de Justiça um entendimento que não corresponde ao teor real do julgado citado.


Por essa razão, encaminhamos à assessoria de imprensa do TJMG um pedido de revisão, justamente para evitar interpretações equivocadas que possam estimular litígios sem fundamento jurídico consistente.


O ponto central é simples: a situação julgada naquela sentença mineira é completamente distinta do que ocorre na maioria dos condomínios brasileiros.


No AREsp 1.837.019/AL (precedente mencionado na notícia) o STJ não afastou a fração ideal, tampouco declarou abusivo o critério.


Naquele caso específico, a convenção do condomínio já havia previsto um critério diferente, estabelecendo o rateio “na proporção das unidades autônomas”. O Tribunal apenas reconheceu a autonomia da convenção condominial, sem qualquer juízo de valor sobre a legalidade ou abusividade da fração ideal.


Para o julgamento da matéria, a regra permanece clara e estável: o critério de rateio é aquele estabelecido na convenção, e a fração ideal segue plenamente válida. O Judiciário só modifica esse cenário quando há vício de consentimento ou ilegalidade na aprovação do critério convencional - hipóteses excepcionais e raras. O próprio TJMG possui jurisprudência contemporânea consolidada nesse sentido. Diversos acórdãos recentes reafirmam que:


  • o rateio por fração ideal é o padrão legal e só pode ser afastado se a convenção expressamente adotar outro critério;

  • não há ilegalidade no pagamento maior por unidades de cobertura que possuem fração ideal superior;

  • o Judiciário não substitui a vontade coletiva manifestada na convenção, salvo ilegalidade manifesta;

  • revisões de critério de rateio não são feitas por sentença, mas por assembleia com quórum qualificado.


Essa é, inclusive, a orientação predominante do STJ, conforme analisamos em parecer técnico recente: a convenção é a lei interna do condomínio, e sua autonomia deve ser preservada.


A alegação genérica de injustiça na fração ideal, por si só, não autoriza sua revisão pelo Judiciário.


Por tudo isso, é importante que síndicos e condôminos saibam que não houve qualquer mudança jurisprudencial. Não há indicativo de que o TJMG ou o STJ estejam revendo o sistema de rateio por fração ideal; ao contrário, as decisões mais atuais seguem reafirmando sua validade.


A interpretação apressada de notícias jurídicas costuma gerar ruído, desnecessário desgaste em assembleias e, muitas vezes, processos que já nascem com baixíssima probabilidade de êxito.


Nosso papel, enquanto assessoria jurídica, é justamente trazer clareza, técnica e segurança para evitar que decisões isoladas se transformem em cenários de conflito amplificados.


A seguir, disponibilizamos o conteúdo integral do e-mail encaminhado ao Tribunal para fins de transparência.

Prezada assessoria de imprensa, Escrevo com o devido respeito para solicitar a revisão de uma matéria publicada no portal oficial deste Egrégio Tribunal, que tem gerado considerável desinformação no âmbito de diversos condomínios edilícios.


A notícia em questão é a intitulada "Justiça considera ilegal taxa de condomínio diferenciada para coberturas", e pode ser acessada pelo seguinte link: https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/justica-considera-ilegal-taxa-de-condominio-diferenciada-para-coberturas-8ACC82199A9916EE019AE5999001443B-00.htm.


O ponto central de nossa preocupação reside na forma como a matéria interpreta e divulga um precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ).


A notícia afirma que a decisão de primeira instância estaria amparada no julgamento do Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº 1.837.019/AL, o qual, segundo o texto, "reforça a possibilidade de afastamento do critério da fração ideal quando este se revelar abusivo e gerador de enriquecimento ilícito".


Contudo, uma análise atenta do referido acórdão do STJ revela que seu conteúdo é distinto do que foi divulgado: no caso do AREsp 1.837.019/AL, a convenção do condomínio em questão não utilizava o critério da fração ideal, mas sim um critério diverso, prevendo o rateio das despesas "na proporção das unidades autônomas".


O STJ, naquela ocasião, limitou-se a reconhecer a autonomia da convenção para estipular um critério próprio, sem adentrar no mérito da justeza ou abusividade do critério da fração ideal.


A notícia, ao generalizar uma situação fática particular e distinta, induz o leitor a crer que o STJ teria criado um precedente genérico contra o critério da fração ideal, o que não corresponde à realidade da decisão.


Essa imprecisão tem o potencial de causar grande instabilidade, incentivando a judicialização de demandas por parte de proprietários de coberturas, sem que haja um real amparo jurisprudencial para suas pretensões, tanto neste TJMG quanto no próprio STJ.


O entendimento contemporâneo e majoritário deste Tribunal é pela legalidade do rateio baseado na fração ideal, quando não há previsão em sentido contrário na convenção.


A título de exemplo, citamos alguns julgados recentes do TJMG que corroboram a validade do critério:


  • TJMG – Apelação Cível 1000022-07.5506-0/001 (18ª Câmara Cível, 03/05/2022) O Tribunal reiterou que o art. 1.336, I, do Código Civil e o art. 12, §1º, da Lei 4.591/64 admitem o rateio pela fração ideal como regra, preservada a autonomia da convenção e inexistente qualquer ilegalidade no pagamento maior por unidades de cobertura. E concluiu: “Não há ilegalidade no pagamento a maior de taxa condominial por apartamentos em cobertura decorrente da fração ideal do imóvel.”


  • TJMG – Apelação Cível 5193528-96.2023.8.13.0024 (18ª Câmara Cível, 21/10/2025)

    A Corte reafirmou que, enquanto vigente, a convenção condominial que adota o critério de fração ideal é válida e eficaz, não cabendo ao Judiciário substituí-la por critério igualitário, ausentes vícios ou prova de enriquecimento ilícito.


  • TJMG – AC 5094679-94.2020.8.13.0024 (10ª Câmara Cível, 15/12/2022)

    O Tribunal foi expresso: “Não há ilegalidade no estabelecimento de taxa condominial com base na fração ideal da unidade imobiliária. (...) Às unidades de cobertura que possuem área superior é lícita a cobrança de valor a maior.”


  • TJMG – Apelação Cível 5163024-15.2020.8.13.0024 (12ª Câmara Cível, 01/11/2024)

    O acórdão sintetiza a posição predominante: “É legítima a previsão de rateio das despesas condominiais proporcional à fração ideal, constante de convenção de condomínio aprovada por maioria, salvo vício ou enriquecimento ilícito comprovado.”


Em suma, o entendimento prevalente na jurisprudência mineira é de respeito à autonomia da convenção condominial, com revisão judicial apenas em hipóteses excepcionais, o que não se compatibiliza com a leitura que pode ser extraída da matéria atualmente publicada.


Diante disso, solicito respeitosamente a revisão do texto, com eventual retificação ou contextualização mais precisa do precedente do STJ, a fim de evitar a propagação de conclusões que não correspondem à jurisprudência atual e que podem estimular litígios sem fundamento jurídico consistente.


Permaneço inteiramente à disposição para esclarecimentos adicionais ou para fornecer notas técnicas que auxiliem a equipe de comunicação, sempre em colaboração e reconhecimento da importância do trabalho desenvolvido pelo Tribunal para difusão correta da informação jurídica.


Atenciosamente,


Amanda Huppes

OAB/DF 63.292



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Este artigo tem caráter opinativo e informativo, baseado em experiência profissional e análise de caso real, com os devidos cuidados para preservação da identidade das partes envolvidas.


As opiniões aqui expressas não substituem consulta jurídica ou técnica específica. As informações não representam recomendação direta de conduta e devem ser avaliadas conforme o contexto de cada situação. O texto não tem a intenção de desqualificar profissionais ou instituições, mas de fomentar reflexão crítica sobre o assunto debatido.







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