Assinar o contrato de obras antes do projeto: um erro comum nas reformas que pode custar caro
- Amanda Huppes
- 1 de mai.
- 4 min de leitura
Parece contraditório, mas acontece com frequência: o proprietário inicia a obra antes mesmo de saber o que, de fato, será feito.
Sem projeto técnico, sem orçamento claro, sem cronograma definido. O resultado? Um contrato que, na prática, não protege quem contrata — e favorece apenas quem executa.
É o que aconteceu com um casal que buscou nosso suporte jurídico após enfrentar uma reforma mal conduzida. A experiência, infelizmente comum, revela os riscos de antecipar a contratação da execução antes de concluir a etapa de projeto.
“Na pressa de começar, muitos assinam o que não deveriam — e acabam pagando o preço da ansiedade com juros e retrabalho.”
O que você verá nesse artigo?
Por que assinar o contrato antes do projeto é juridicamente arriscado;
Quais cláusulas não podem faltar em um contrato de execução de obra;
As consequências financeiras de uma contratação precipitada;
Os cuidados essenciais que todo contratante deve observar;
Como prevenir conflitos com apoio jurídico especializado desde o início
O caso: contrato de obra sem projeto definido
Em outubro de 2020, um casal de idosos contratou um escritório de arquitetura para projetar a reforma do interior de seu novo apartamento.
O contrato previa a entrega dos projetos em 45 dias por R$ 15.000,00.
Contudo, antes mesmo da entrega dos projeto, o escritório os convenceu a assinar um contrato de execução da obra no valor de R$ 160.000,00, com preço global fechado — sem memorial descritivo, sem cronograma detalhado, sem definição clara de materiais ou serviços.
A execução começou sem base técnica consolidada, um erro que comprometeu toda a obra.
Quando o projeto é adivinhado, o orçamento também é
Assinar um contrato de execução antes de conhecer o escopo exato da obra revela mais do que uma precipitação: revela improvisação profissional.
Se o prestador fecha um preço sem saber quais materiais serão usados, quais técnicas de acabamento serão utilizadas ou quais interferências estruturais existirão, o que ele está fazendo não é planejamento — é chute técnico.
E como esse “chute” muitas vezes subestima os custos reais, o que costuma acontecer é o seguinte:
A obra avança até onde o dinheiro cobre;
Quando surgem imprevistos ou os recursos se esgotam, o prestador abandona o contrato;
O contratante, sem amparo técnico ou jurídico, fica com uma obra pela metade e um prejuízo integral.
Falta de projeto = contrato sem parâmetros
Sem um projeto executivo completo, não há como definir o que será entregue, quando, como, e por qual custo. Isso leva a contratos frágeis, que não asseguram prazos, padrões de qualidade ou responsabilizações claras.
O recomendado para uma obra segura é que os contratos de execução tenham os projetos executivos como anexos do contrato, justamente para balizar os serviços, técnicas e materiais contratos. Via de consequência, para poder cobrar a adequação dos serviços entregues no futuro, bem como impedir cobranças extras por serviços que já estavam contratados.
Conflito de interesses: projetar, executar e controlar
Outro ponto sensível no caso foi a concentração de funções na mesma empresa: o escritório que elaborou o projeto foi também o executor da obra.
Esse acúmulo cria um conflito de interesses inevitável, pelo menos enquanto não aprovada a versão final do projeto:
O executor não quer contrariar o cliente, mas também não quer executar algo que comprometa sua margem de lucro;
Ao saber previamente o valor a ser respeitado, a tendência é “ajustar o projeto” à realidade orçamentária, sem avisar o cliente — geralmente cortando qualidade, mão de obra ou itens essenciais.
Consequências reais: prejuízo de mais de R$ 88 mil
No caso, a ausência de planejamento e controle técnico-jurídico gerou:
Abandono da obra antes da entrega completa:
Falta de entrega de projetos essenciais (elétrico, hidráulico, estrutural);
Execução com baixa qualidade e retrabalhos recorrentes;
Despesas adicionais com aluguel, depósitos e contratação de nova equipe.
O casal precisou refazer a obra e arcar integralmente com os custos, sem conseguir qualquer reembolso da empresa anterior, que estava com pouca saúde financeira.
Pagamentos devem ser vinculados a entregas concretas e aprovadas
Outro erro frequente em contratos de obra é o pagamento por etapas mal definidas, ou desvinculado da entrega efetiva.
Para evitar desequilíbrios, é fundamental que:
Cada etapa da obra tenha objetivos técnicos mensuráveis;
A liberação de pagamento dependa da conclusão da etapa anterior e sua aprovação técnica/documental;
O cronograma físico-financeiro esteja alinhado com os marcos de entrega — e não apenas com o tempo corrido do contrato.
Essa estrutura protege o contratante e previne o risco de adiantar valores sem a contrapartida de execução válida.
Como evitar esse tipo de prejuízo?
Antes de assinar qualquer contrato de obra, exija:
✔️ que o Projeto executivo esteja completo e aprovado;
✔️ Memorial descritivo com todos os materiais e métodos, mesmo que esse detalhamento esteja no próprio projeto;
✔️ Cronograma físico-financeiro compatível com a execução;
✔️ Emissão de RRT/ART pelo responsável técnico;
✔️ Contrato com cláusulas claras sobre escopo, prazos, penalidades e garantias.
E, acima de tudo: busque orientação jurídica especializada antes da contratação. Isso transforma a sua obra em um processo seguro — e não em uma fonte de litígios.
Quando o projeto não está pronto, o contrato é uma promessa vaga — e perigosa.
O contratante assina sem saber exatamente o que comprou, enquanto o executor começa sem saber exatamente o que precisa entregar.
Esse desequilíbrio é evitável com técnica, cautela e acompanhamento jurídico.
Obra segura não começa com pressa. Começa com projeto, clareza e contrato sólido.
As informações contidas neste artigo têm caráter informativo e não substituem a análise técnica específica de cada caso.
A aplicação prática das orientações aqui apresentadas depende das circunstâncias concretas envolvidas em cada relação contratual. Para segurança jurídica, recomenda-se a avaliação individualizada por profissional habilitado.
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