Cobrança de taxas condominiais em lojas térreas com entrada independente: o que diz a jurisprudência e como agir estrategicamente
- 5 de fev.
- 4 min de leitura
Atualizado: 23 de abr.
Empresas e comércios que operam em lojas térreas com entrada independente, rede de água e energia autônomas e sem qualquer utilização das áreas comuns de um condomínio frequentemente se deparam com um impasse: devem arcar com o rateio de despesas condominiais gerais, como limpeza, conservação e iluminação das áreas comuns?
O que você verá nesse artigo?
Qual é o entendimento do TJDFT sobre a cobrança condominial de unidades térreas com entrada independente;
Como o STJ tem decidiu casos semelhantes?;
Exemplo real de uma empresa impactada por essa cobrança;
Quais provas são indispensáveis para fundamentar eventual ação judicial;
Cenários em que é possível judicializar e o que considerar antes disso;
O que significa preparar uma ação que já nasce com estrutura recursal?
Independência física x obrigação legal de participar das despesas
Mesmo quando a unidade comercial não usufrui de elevadores, áreas de lazer, corredores internos ou portarias, a convenção condominial geralmente não a isenta de arcar com os gastos relacionados a essas rúbricas.
Esse cenário levanta uma dúvida legítima: é possível contestar essa cobrança judicialmente?
A resposta não é simples — e depende de uma análise jurídica e estratégica muito bem fundamentada.
TJDFT é conservador: maioria das decisões rejeita a tese de exoneração
No âmbito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), a tese de exoneração da cobrança por rubricas como limpeza e energia das áreas comuns não encontra ambiente receptivo.
Levantamento recente de julgados sobre o tema revelou que a maior parte das Turmas Cíveis do TJDFT são desfavoráveis à exclusão de despesas para unidades com entrada independente, mesmo que não utilizem os serviços compartilhados.
A fundamentação costuma seguir o princípio de que, mesmo não utilizando diretamente a estrutura, o proprietário ainda é parte do condomínio, e, por isso, deve contribuir com as despesas comuns conforme previsto na convenção registrada.
Mas o STJ tem demonstrado abertura maior à tese
Em contraste, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem proferido decisões mais sensíveis à realidade prática das unidades térreas autônomas.
O entendimento vem se consolidando no sentido de que, quando há prova robusta de que a unidade não se beneficia das áreas comuns, é possível sim rever as rubricas impostas às empresas no rateio, com base no artigo 1.340 do Código Civil.
Essa previsão diz que as despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo devem ser arcadas apenas por quem delas se serve:
Art. 1.340. As despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um condômino, ou de alguns deles, incumbem a quem delas se serve.
Prevaleceu essa linha, por exemplo:
No REsp 1652595/PR
No AREsp 2105164/SP, onde o STJ reconheceu a possibilidade de revisão do rateio condominial e vedou o enriquecimento sem causa dos demais condôminos.
Mais recentemente, no caso analisado no AREsp 2804544/GO, o ministro Marco Buzzi decidiu em favor de unidade comercial térrea com entrada e funcionamento independentes, determinando que esta só deve contribuir pelas despesas relativas às áreas das quais efetivamente se beneficia.
Caso real: escola de idiomas e a difícil decisão sobre a judicialização
Um exemplo concreto dessa situação que recebemos em nosso escritório pode ilustrar os riscos e cuidados dessa estratégia jurídica.
Uma escola de línguas, em funcionamento em uma unidade comercial no térreo de um condomínio residencial, buscava excluir-se da cobrança por limpeza e serviços comuns.
Mesmo com entrada independente e infraestrutura separada, a unidade vinha arcando com mais de R$ 29.000,00 por ano em despesas que não utilizava diretamente.
Após análise jurídica minuciosa, verifcamos que, embora o STJ seja mais sensível à tese, a jurisprudência local (TJDFT) continua amplamente contrária à exoneração.
A recomendação, portanto, foi clara: qualquer ação judicial nesse sentido deve nascer com uma estratégia recursal própria, desde o início.
Empresários que pretendem seguir por esse caminho precisam entender que não basta alegar que não usam a área comum — é necessário provar.
A petição inicial deve estar rigorosamente instruída, contendo:
Laudo técnico de vistoria comprovando a independência da entrada e das redes elétrica e hidráulica;
Registro fotográfico da ausência de uso das áreas comuns;
Plantas da unidade e da edificação, com esquemas elétricos e hidráulicos, se houver;
Comparativo com precedentes do STJ, especialmente os casos que envolvam entrada independente, ausência de uso das áreas comuns e autonomia estrutural;
Citação explícita do artigo 1.340 do Código Civil e fundamentação doutrinária.
Importante: não se trata apenas de propor uma ação, mas de preparar um processo com estrutura recursal, já mirando a possibilidade de levar o tema ao STJ.
A tese da exoneração de rubricas condominiais para lojas térreas independentes é juridicamente viável quando bem fundamentada e estrategicamente conduzida.
O risco de improcedência nas instâncias locais ainda é alto, especialmente no DF.
Por isso, a decisão de judicializar deve ser tomada com base em:
Análise de risco personalizada;
Documentação técnica robusta;
Projeção de custo-benefício financeiro a longo prazo.
Ao mesmo tempo, o cenário abre espaço para negociação extrajudicial bem fundamentada, apresentando ao condomínio uma solução alternativa que evite custos processuais para ambos os lados.
As informações contidas neste artigo têm caráter informativo e não substituem a análise técnica específica de cada caso.
A aplicação prática das orientações aqui apresentadas depende das circunstâncias concretas envolvidas em cada relação contratual. Para segurança jurídica, recomenda-se a avaliação individualizada por profissional habilitado.
FAQ - Perguntas frequentes
Ter uma loja térrea com entrada independente já garante a isenção das taxas condominiais?
Não. A entrada independente é um fator importante, mas não basta isoladamente. É necessário comprovar que a unidade não faz uso das áreas comuns e apresentar documentos técnicos que sustentem essa autonomia, além de buscar técnicamente a aplicação dos precedentes ao caso, demonstrando sua similitude.
A convenção do condomínio pode obrigar ao pagamento mesmo sem uso das áreas comuns?
Sim. As convenções geralmente determinam a divisão de despesas com base na fração ideal, e os tribunais costumam manter essa regra — a menos que haja fundamentação legal e técnica que justifique a exclusão.
O STJ já decidiu a favor da exoneração nesses casos?
Sim. O STJ tem reconhecido, em alguns precedentes, a possibilidade de excluir determinadas rubricas do rateio, quando há independência funcional e comprovação da utilização exclusiva das áreas comuns.
É possível negociar com o condomínio sem ir à Justiça?
Sim. Em muitos casos, uma negociação extrajudicial bem fundamentada, acompanhada dos documentos certos, pode ser suficiente para revisar as rúbricas cobradas, sem judicialização.
Outras
Cada imóvel tem suas particularidades. Quando se trata de questionar encargos condominiais, uma análise individualizada da situação — considerando estrutura, uso e previsões da convenção — pode evitar decisões precipitadas ou ações improcedentes.